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sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Politicamente quase correto




Alterar a linguagem é mudar o mundo, sabemos disso. Talvez isso tenha começado desde o instante que, ainda rústicos e em cavernas, balbuciamos (= falar de maneira confusa) os primeiros sons comunicativos. Entretanto, só ao final do século XIX e principalmente no século XX ganhamos a consciência desse nosso poder. Foi só então que fizemos a “guerra semânticavir propositalmente adiante de qualquer outro tipo de ação. Falar de modo “politicamente correto” se tornou no final do século XX, algo importante em todo o Ocidente.

Na “poderosa” civilização EUA, o “politicamente correto” se estendeu de tal modo e se ampliou de maneira que logo provocou a reação dos mais conservadores. Alguns conservadores mais inteligentes combateram o “politicamente correto” por meio do humor. Ao final, até mesmo a esquerda mais liberal aderiu. Foi o tempo dos engraçados “contos de fadas politicamente corretos”, em que o Lobo Mau tinha de ser chamado de “Animal de Instintos Excessivamente Unidirecionados” e o Pinóquio não podia ser adjetivado de mentiroso e, sim, de “Sujeito Propenso à Conduta Anti-social” e assim por diante. Todavia, a reação não venceu. Ela foi massacrada pelas novas leis que foram incorporando o “politicamente correto”. Trinta anos depois, ele esquenta nossa imprensa.

Jerffeson, por que diabos os brasileiros se envolveram nisso? O problema não era nosso, o problema era americano. Mostrarei um a la efeito borboleta, Muahahehau! A nossa baixa (pra não dizer nenhuma) escolaridade e a nossa deterioração da escola pública, uma vez juntas, lançou em cargos de liderança, em vários setores, pessoas cujo único aprendizado veio do campo valorativo da luta política. Essas pessoas nunca puderam aprender conceitos, mas ouviram dizer e acreditaram que sobre elas havia preconceitos (bem comum neh?). Nunca puderam entender que o pré-conceito é para quem não chegou ao conceito, o caso dessas. Entenderam, erradamente, que o preconceito é uma espécie de má vontade ou raiva contra elas (isso seria uma das consequências e não o que é de fato). Então, transformaram tudo em preconceito. Tudo que imaginam ser “politicamente incorreto” é assimilado ao que acreditam ser o “preconceito”, assim, com o bastão da censura nas mãos, começam a querer decepar nossa a linguagem e a nossa cultura. Antes vítimas, agora agem rapidamente como carrascos. De líderes honrados de movimentos populares com nobres objetivos se transformam em estalinistas toscos cuja idéia básica é a vingança.

Fortificados unicamente da falta de conhecimento, essas pessoas perdem a noção do que é, na linguagem, a denotação e a conotação (revisão de português? aheahaheu). Para elas todo e qualquer discurso é unicamente conotativo e, não tendo nunca visto um discurso com conceitos, qualquer coisa que possa servir como instrumento político de ataque é por elas agarrado e utilizado. Para que fique claro o que quero dizer aqui, exemplificarei com um fato recente:

Sem que o Cônsul do Haiti soubesse que o microfone ainda estava ligado. Avaliando a desgraça do Haiti após o terremoto, e contando que aquilo era bom para o seu consulado que estava ficando conhecido, o cônsul Antoine disse claramente, com convicção: “Acho que de, tanto mexer com macumba, não sei o que é aquilo (…). O africano em si tem maldição. Todo lugar que tem africano lá tá fudido.” (L algo mais a comentar?)

Sem dúvidas que há aí pré-conceito. O conceito de africano implica na idéia de alguém, natural da África ou descendente de naturais da África, que adota religiões que o cônsul ligou sob a rubrica de “macumba”. Essas religiões podem trabalhar com princípios “mágicos”, por exemplo, o de lançar maldições etc. Todavia, o conceito de africano, que é algo de nossa cultura escolar ocidental, não vê tais “maldições” como possíveis. Trata-se de mexer com o que seriam as forças sobrenaturais de modo que elas viessem a intervir nas forças naturais (e sabemos que não é de fato o que ocasionou o terremoto). Ora, o cônsul agiu como uma pessoa que ficou aquém da boa escolarização ocidental, laica e iluminista. Ficou aquém da aquisição do conceito de africano e do conceito de religiões afro que utilizamos em nossa sociologia e em nossa antropologia. Ele faltou às aulas de geografia do ensino médio do que seria uma boa escola pública laica, é o mínimo que podemos dizer, ficou no pré-conceito.

E não vou nem comentar (já comentando) que na mesma época o jornalista da globo, Jabor. Ele fez um programa em um tom sóbrio e descrevendo corretamente a evolução política do Haiti e, quase ao final, lança a seguinte questão: “Como democratizar um país miserável, analfabeto e com raízes tribais africanas bárbaras?”. HAHAHEHAHUAAHAUHUA (gargalha irônica)... sério mesmo, reflitam nesta frase!

Nosso caminho para o trabalho com o politicamente correto é bem mais árduo que aquele percorrido pelos americanos. Desculpem-me o tamanho texto, mas ficar muito tempo sem escrever (digitar) faz-me querer tirar o atraso literal. Espero que tenham gostado e que tenha sido bem didático este assunto tão entrelaçado.

Jerffeson Cunha